Em tempos de crise (17) - Viver para servir

Em tempos de crise (17) - Viver para servir

 

Há um ditado que  diz o seguinte – “Quem não vive para servir não serve para viver”.

Ora, nestes dias de Semana Santa, vividos em circunstâncias únicas e até há pouco impensáveis, com isolamento em nossas casas, vale a pena pensarmos nesta recomendação da sabedoria popular que em muito nos pode ajudar. Está em causa ir ao essencial da nossa vida e descobrir como é fonte uma felicidade indizível fazer bem sem olhar a quem e sem enjeitar os sacrifícios para tal necessários sejam quais forem os que as circunstâncias nos exigirem.

Nestes dias de pandemia em que o sofrimento e alguma consternação tomam conta de muitas pessoas, vale a pena parar diante da passagem bíblica de Isaías 42,1-7 em que nos é apresentada a figura do Servo de Deus, carregada de grande simbolismo. Trata-se de alguém que se sente enviado por Deus para promover a justiça no mundo. Missão difícil que encontra pela frente  mil dificuldades e oposições. A atitude assumida é a de  excluir qualquer forma de violência nem que para tal seja necessário abdicar de direitos essenciais; sobretudo não responder na mesma moeda a quem nos faz mal. Compreendemos como uma atitude assim vai ao arrepio do sentir e da prática comum das pessoas, que, por tendência, colocam os direitos acima de tudo, sem que muitas vezes lhes façam corresponder os respectivos deveres. Exige-se o pagamento das dívidas até ao último centavo, esquecendo que, muitas vezes, a dívida própria é ainda superior.

 “Quem não vive para servir não serve para viver”.

A verdade desta afirmação da sabedoria popular vemo-la confirmada, nestes dias de Semana Santa, diante da figura de Cristo crucificado.

Também ele , em determinado momento, fez sentir aos seus que a vontade de poder tem de ser corrigida pelo espírito de serviço, de tal maneira que quem quiser salvar a sua vida vai perdê-la e quem a souber perder esse há-de ganhá-la. E o exemplo do grão de trigo que só dará fruto se se deixar morrer é aquele que deve continuar a inspirar as opções que havemos de saber tomar para dar sentido verdadeiro à nossa vida.

O Papa Francisco, na homilia de ontem, Domingo de Ramos, na Basílica de S. Pedro, deserta, fazia uma recomendação que vale a pena registar e fazer dela guia das nossas reflexões ao longo destes dias de Semana Santa e de Páscoa.

Dizia ele:

“Permaneçamos em casa [nestes dias], diante do crucificado, medida do amor de Deus por nós.

Diante de Deus que nos serve até dar a vida, peçamos o desejo de viver para servir.

Procuremos contactar quem sofre, quem está sozinho e necessitado; não pensando naquilo que nos faz falta, mas sobretudo no bem que podemos fazer”.

 

Que estes dias de Semana Santa e de Páscoa nos possam inspirar sentimentos de adesão à atitude de fazer bem sem olhar a quem e de verdadeira partilha com aqueles que mais precisam.

 

6.4.2020

 

+Manuel R. Felício, Bispo  da Guarda