IV Domingo da Páscoa

IV Domingo da Páscoa

3.5.2020

 

Celebramos hoje o Domingo do Bom Pastor;

Encerramos a semana de oração pelas vocações;

E festejamos o dia da Mãe.

 

Começando do fim para o princípio, desejamos em primeiro lu­gar tributar o nosso reconhecimento e prestar a nossa ho­me­nagem a todas as mães. Expressamos-lhes principal­men­te a nossa gratidão pela sua capacidade de amar até ao ponto de estarem dispostas a dar a vida para que outros tenham vida. E neste dia, é bom cada um de nós fazer um esforço de memória para revisitar momentos especiais onde a presença da nossa mãe foi mais palpável e marcante. Pode ter sido o momento em que pronunciamos pela primeira vez o nome de mãe, ou aquele em que dela aprendemos a primeira oração ou simplesmente nos foi indicada a imagem sugestiva do anjo da Guarda ou outra. Pode ter sido aquele conselho  que nos ajudou a tomar a decisão mais determinante da nossa vida ou então aquela chamada de atenção que nos levou a corrigir algum erro mais persistente ou a definir rumos novos no nosso comportamento. Neste mês de Maio, o Mês de Maria que ainda vai no seu início, queremos olhar para aquela que é o modelo de todas as mães, sobretudo porque santuário da vida e do amor,  e pedir-lhe uma bênção especial para todas elas. E damos também, neste dia, abundantes graças a Deus pelo dom sublime do amor das mães, dom esse que nunca será suficientemente apreciado e  agradecido.

 

Nesta semana de oração pelas vocações fomos convidados pelo Papa Francisco a revisitar o modelo de vida sacerdotal d o Santo Cura d´Ars, de quem  celebrámos, em agosto último, os 160 anos passados sobre a data do seu falecimento. O Papa resume o impacto desta vocação modelar nas circunstâncias atuais e nomeadamente naqueles que são chamados ao exercício do mesmo minis­tério, os sacerdotes, em quatro palavras, a saber: tribulação, gratidão, coragem e louvor.

De facto a tribulação visita-nos a todo o momento. E não pode­mos pensar em vidas onde tudo corre sobre esferas e sem dificuldades. As tribulações fazem parte das nossas vidas e da vida do mundo. E elas surgem quando menos se pensa, como acontece agora com a pandemia, que, há poucos meses, quase ninguém adivinhava. Mas é no meio das tribu­lações que mais apreciamos quem nos ajuda, quem nos estende a mão. Sabemos que não estamos sozinhos, mesmo que o silêncio de Deus, por vezes, nos pareça  chocante, por­que a verdade é que Ele está sempre connosco, embora com presença discreta, para em nada nos substituir, mas em tudo  potenciar as nossas capacidades e nos garantir a luz do discernimento nas grandes decisões da vida.

Estamos-lhe profundamente gratos por esta sua presença contínua nas nossas vidas, sempre a interpelar-nos e a apon­tar-nos caminhos novos, assim nós estejamos atentos à sua passagem discreta por nós. Quando percorremos, com olhos de ver a nossa vida vivida, descobrimos momentos especiais em que o seu olhar amoroso veio ao nosso encontro e nos desafiou por caminhos determinados e depois disso não cessou nem cessa de nos interpelar. Sim, porque a vocação não é um acontecimento do passado, mas o contínuo chamar de Deus por cada um  de nós e seguindo à nossa frente.

Toda a vocação enquanto resposta à chamada de Deus, sobretudo no que ela supõe de opção fundamental para vida exige coragem e tanto mais quanto vivemos hoje mergulha­dos em condicionalismos sociais que não favorecem os com­pro­missos para  a vida. Pela cultura dominante, vai sendo passa­da a mensagem de que não pode haver compromissos defini­tivos, porque o que hoje é assim amanhã pode se de ou­tra maneira ou simplesmente não ser. Como consequência a fidelidade nos compromissos não é defensável. Esta cultu­ra débil, que está a marcar e muito os procedimentos e os hábitos das pessoas não pode gerar verdadeira  felicidade. Por isso, há que assumir a coragem de optar por uma cultura diferente que valorize os compromissos para a vida e a luta por lhes sermos fiéis até ao fim. E esta coragem é tanto mais necessária quanto sentimos ventos fortes e contrários a agitar as nossas vidas e a vida do mundo. Não ignoramos as dificuldades que é preciso vencer, desde o cansaço e o risco da solidão até à monotonia que muitas vezes apaga a chama e o ardor do amor primeiro e também às incertezas e precaridades dos tempos atuais ou o medo do futuro. Estas e outras dificuldades vemo-las representadas nos tempos difíceis de pandemia que estamos a viver. Diante de todas elas não cruzamos os braços, mas escutamos de novo a Palavra de Jesus dirigida aos seus discípulos, no meio da tribulação: “Coragem. Não temais”. É então que, mesmo no meio das ondas mais alterosas tomamos consciência de não estarmos sozinhos e abrimo-nos à dimensão do louvor por esse dedo tantas vezes invisível, que sempre nos aponta o caminho certo. Como Maria Santíssima manifestamo-nos profundamente agradecidos pelo olhar que Deus, um dia,  colocou sobre nós e louvamo-lo por isso, procurando fazer da nossa vida toda ela um verdadeiro hino de louvor.

 

Hoje é o Domingo do Bom Pastor.

Como sabemos Bom Pastor há só um, Jesus Cristo e para aí nos chama a  atenção o Evangelho de hoje. Ele é o Bom Pastor, mas é também a porta por onde têm de entrar aqueles que hoje são chamados a continuar a mesma missão de pastorear o santo Povo de Deus. E esses são aqueles que, pelo Sacramento da Ordem, o mesmo Jesus quis associar a si no exercício da sua missão de cabeça e pastor de todo o povo de Deus

Este é, por isso, o dia de todos nós sacerdotes manifestarmos a nossa gratidão pela missão que nos está confiada. Também é ocasião para todo o Povo de Deus manifestar o mesmo reconhecimento ao Senhor pelos pastores que continua a oferecer-lhe e pedir-lhe que sejam pastores cada vez mais segundo o coração de Jesus, o único Bom Pastor. E ainda que nunca faltem à Igreja aqueles de que ela precisa.

Este dia do Bom Pastor é para nós sacerdotes nos sabermos ver ao espelho das recomendações de Jesus. Perguntamo-nos, por isso,  pelas nossas relações com aqueles e aquelas que nos estão especialmente confiados. Apesar de estarmos condicionados pela pandemia, não deixa de ser nossa missão acompanhá-los e sobretudo os que mais se encontram em dificuldade. Será que eles e elas conhecem mesmo a nossa voz e ouvem-nos chamá-los pelo seu nome próprio, sentindo-nos presentes sobretudo nos momentos mais difíceis? Diz o Evangelho de hoje que o pastor vai à frente apontando os caminhos que conduzem às melhores pastagens. E quando isso acontece, o nosso zelo atrai mesmo as pessoas para seguirem ao encontro de Jesus, a verdadeira porta de entrada e saída para as melhores pastagens. Tudo depende da identificação que nós hoje conseguirmos ou não fazer com o único Bom Pastor Jesus Cristo. Ele é, de facto, a verdadeira porta, por onde entram e saem as ovelhas, mas sobretudo os verdadeiros pastores, porque os falsos pastores, ladrões  e salteadores, não entram e saem por ela. Es­ses procuram outras entradas, porque não lhes interessa o cuidar das ovelhas, mas somente o proveito que elas lhes possam vir a dar. O desafio que nos é feito consiste em seguir o modelo do único Bom Pastor, dispondo-nos também a dar a vida para que elas tenham vida e vida em abundân­cia.

Neste modelo do único Bom Pastor se tem de fundar toda a verdadeira pastoral ou seja  a arte de conduzir, nos dias de hoje, os fiéis e as comunidades pelos caminhos da formação e  celebração da fé, com  todas a s suas consequências na vida da Igreja e da sociedade.

O apóstolo Pedro, em dia de Pentecostes, como nos é referido pelos Atos dos Apóstolos, responde aos ouvintes que escutavam o primeiro anúncio sobre a Pessoa de Jesus com o apelo à conversão e a pedirem o Baptismo, na certeza do dom do Espírito Santo. Todo o serviço da ação pastoral nos dias de hoje é para renovar as mesmas propostas. E nós, como ovelhas desagarradas que fomos, mas agora voltados para o Bom Pastor Jesus Cristo, são palavras da Carta de Pedro, temos pela frente o apelo a gerir as situações difíceis que atravessamos e outros connosco, sempre com o olhar colocado em Jesus. Sabemos que ele sofreu por nós, como nos lembra hoje a  carta de S. Pedro, dando-nos o exemplo para que saibamos também levar o nosso sofrimento com paciência, na certeza de que assim completamos a obra de Jesus que fez do seu sofrimento e da sua morte o grande presente de redenção para toda a humanidade.

Que este Domingo do Bom Pastor, a semana das vocações que nele encerramos e o dia da mãe que hoje festejamos nos transmitam o suplemento de coragem para termos verda­deira alegria de viver, mesmo em situações difíceis como as atuais  e sabermos transmiti-la a outros. E a isso nos ajudem os tempos de Páscoa que continuamos a viver, até ao Pentecostes.

 

3.5.2020

 

+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda