
Solenidade da Ascensão
24.5.2020
1.Celebramos a Solenidade da Ascensão do Senhor.
É a hora da passagem do testemunho de Jesus para os seus discípulos mais próximos. Estes vêem Jesus partir ao encontro do Pai, com alguma saudade, mas sem se sentirem abandonados. Recebem o mandato de ir e ensinar a Boa Nova por toda a terra.
Assim, ao tempo de Jesus, em sua missão visível na história, sucede o tempo da Igreja, animada pela presença, agora invisível do seu Mestre e Fundador, na força do Espírito Santo prometido.
Celebramos também hoje o Dia dos Meios de Comunicação Social. Todos somos chamados a contribuir para que esta poderosa força de intervenção na vida das pessoas e do mundo seja sempre fiel à verdade.
E a verdade é a vida das pessoas, vida que faz história e vida que se alimenta de histórias, muitas delas acumuladas ao longo dos tempos. Daí a importância da memória que põe em contacto com riquezas e bens fundamentais para as nossas vidas. Compreende-se, assim, a importância do património recebido das gerações anteriores com riquezas que foram crescendo, ao longo do tempo, que havemos de saber fruir e, quanto possível, transmitir com valor acrescentado à gerações futuras. A herança da memória tão decisiva para a vida das pessoas não pode, por isso, ser ignorada pela Comunicação, que, em princípio, existe para estar ao serviço.
Encerramos também hoje a semana dedicada à encíclica “Laudato sí” do Papa Francisco, publicada há cindo anos, meio ano antes da cimeira de Paris sobre as mudanças climáticas. Por ela, todos são chamados a dar resposta urgente à crise ecológica. E como insiste o Papa, não podemos fechar os ouvidos ao grito da terra e simultaneamente ao grito dos pobres. Daí o apelo a cuidarmos da criação, dom do nosso Bom Deus e criador. Está em causa procurarmos saber que mundo e que natureza queremos legar às gerações futuras, que nos vão suceder; que herança lhes queremos deixar.
2.A Ascensão de Jesus encerra um capítulo, a saber, a sua presença e ação visíveis no mundo entre aqueles que ele próprio escolheu e formou e abre outro capítulo, que é o da vida da Igreja.
Para isso nos chama a atenção a passagem hoje escutada do livro dos Atos dos Apóstolos, Assim, se no seu primeiro livro, diga-se o Evangelho de Lucas, a preocupação do autor foi narrar todas as coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar, o segundo livro, isto é, o Livro dos Atos dos Apóstolos, vai narrar a vida da Igreja nascente.
A Ascensão é o momento da passagem de testemunho.
E os discípulos, embora no meio ainda de alguma obscuridade e muito medo, limitados na compreensão da novidade do Evangelho – ainda perguntavam se era agora que Jesus ia restaurar o reino de Israel – o certo é que, com a luz e a força do Espírito Santo, avançaram no cumprimento da missão.
Custou-lhes a despedida, com certeza. Por isso ficaram ali parados, a olhar para o céu, enquanto a nuvem lhes ocultava Jesus. Foi preciso virem dois anjos para que eles caíssem em si, quando ouviram a interpelação – Homens da Galileia, porque estais a olhar para o céu?
Agora, de facto, é o tempo de olhar para a terra, para o mundo, na variedade das pessoas e das culturas e levar-lhes a riqueza do Evangelho. Até à segunda vinda de Jesus, esta é a hora deles, a hora da Igreja, a nossa hora de discípulos de Cristo.
Não foi inteiramente fácil esta passagem do testemunho e o cumprimento do mandato recebido do Mestre, para irem por todo o mundo, devendo imediatamente regressar à Galileia, diga-se à vida real das pessoas, em suas diferentes situações.
E essa dificuldade encontra-se espelhada no Evangelho de Mateus, onde se diz que, mesmo no momento crucial dessa passagem do testemunho, quando seria suposto haver perfeita sintonia entre o pensar do Mestre e dos discípulos, estes ainda duvidaram. Apesar de tudo, Jesus, que os conhecia muito bem, não desistiu e confiou-lhes mesmo o mandato – “Ide e ensinai todas as nações, baptizando em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo...Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos”.
Assim, a presença do mesmo Jesus ressuscitado e vivo com eles até ao fim dos tempos e a companhia do Espírito Santo com a sua força e sua luz são garantia de que a missão vai ser cumprida. Eles abem que podem contar com a mesma força de Deus que ressuscitou Jesus, agora sentado à sua direito no Céu, lembra-nos hoje S. Paulo e com a sabedoria do Espírito que os vai conduzir para a verdade total.
3.Estamos assim no tempo da Igreja.
A nós enquanto discípulos do Mestre está-nos confiada a responsabilidade de a organizar hoje, da melhor maneira, para cumprir o mandato de Jesus e levar o serviço do Evangelho à vida das pessoas.
A missão da Igreja, sem prejuízo de obedecer ao mantado de Cristo, não está definida de uma vez para sempre. Isto, porque as circunstâncias do tempo e a própria vida das pessoas e da sociedade estão em constante mudança. E nós somos enviados para anunciar a Boa Nova de Jesus não em abstrato ou em função de teorias e ideologias que nada têm a ver com a vida real das pessoas e o seu bem. Pelo contrário, para cumprirmos a nossa missão evangelizadora de discípulos batizados, precisamos de conhecer bem as pessoas às quais nos dirigimos, as circunstâncias atuais da sua vida, os seus verdadeiros interesses, as suas potencialidades e as suas dificuldades.
Este primeiro exercício temos de o fazer no terreno, na maior proximidade com cada um, com muita paciência e dedicação. Esse é o primeiro passo da evangelização ao qual têm de se sujeitar todos os outros, como sejam programas e organizações pastorais.
E essa precisamos que seja a preocupação de todos os fiéis, cada um segundo o lugar que ocupa nas comunidades, as capacidade que Deus lhe deu e os ministérios ou serviços que está convidado a desempenhar.
Hoje, Solenidade da Ascensão, em que celebramos a passagem de testemunho de Jesus para os seus discípulos mais diretos, interrogamo-nos também sobre as formas como reunimos e utilizamos os necessários meios humanos e materiais para cumprirmos esta nossa missão.
Entre esses meios estão os órgãos de comunicação social, tanto os que são diretamente tutelados pela Igreja, como é o caso da chamada Imprensa Católica, como também os outros que se propõem estar ao serviço do desenvolvimento integral das pessoas.
Temos de reconhecer que estamos longe de ter percebido a importância destes meios no processo da evangelização e de termos conseguido o seu melhor uso.
Por isso, é esta também a hora de pedir a sabedoria do alto para nos ajudar a dar cumprimento à recomendação da nossa Assembleia Diocesana sobre o melhor uso destes meios na vida pastoral da Diocese, das Paróquias e dos seus diferentes serviços e instituições.
Louvemos o Senhor ressuscitado e vivo na Glória, sentado à direita de Deus Pai, sem deixar de estar connosco até ao fim dos tempos, como prometeu.
+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda