Do Sínodo Diocesano de 1949, à Assembleia Diocesana de 2017

Do Sínodo Diocesano de 1949, à Assembleia Diocesana de 2017

Diocese da Guarda

 

Do Sínodo Diocesano, 1949

À Assembleia Diocesana, 2017

 

I-Sínodo Diocesano, em 1949

 

O último Sínodo Diocesano da Diocese da Guarda realizou-se em 1949, nos dias 6, 7 e 8 de julho. Foi convocado por decreto episcopal, assinado por D. José Ma­­toso e datado de 20 de abril do mesmo ano, sendo a convocatória dirigida aos seguintes participantes: Bispo coadjutor (D. Domingos da Silva Gonçalves) e Bispo Auxiliar (D. João de Oliveira Matos), Vigário Geral, Cabido, Reitor e Vice-reitores dos seminários, um sacerdote delegado por cada um dos 21 arci­pres­tados, os párocos da cidade da Guarda, os sacerdotes superiores das comuni­dades religiosas clericais, os sacerdotes assistentes dos organismos dioce­sanos.

O decreto estabelece como objetivo deste sínodo “codificar a legislação dioce­sana” publicada depois de promulgado o Código de Direito Canónico (1917), depois do Concílio Plenário Português (1926) e tendo em conta a Concordata de 1940. Deixa a pretensão de que ele venha a marcar o início de uma nova época de ressurgimento na pastoral e na disciplina.

 

O programa cumpriu-se, com a abertura solene no dia previsto, 6 de julho, domingo. Depois de procissão organizada a partir da Igreja da Misericórdia, foi celebrada Eucaristia na Sé, sob presidência do Bispo Coadjutor, sendo assistida por clero e povo. De tarde, prosseguiram, no Seminário da Guarda, os trabalhos, tal como no dia seguinte. O dia 8, terça-feira, foi de encerramento, com cele­bra­ção Eucarística de ação de graças, na Sé, também presidida pelo Bispo Co­ad­jutor, tendo o Prelado Diocesano D. José Alves Matoso pronunciado o discur­so final, antes do solene “Te Deum” conclusivo.

 

Com data de 1 de novembro de 1949 foi publicado o decreto episcopal que sancionou e promulgou as constituições sinodais, com a indicação de estas entrarem em vigor dois meses depois.

 

As constituições são 28, a primeira dedicada aos clérigos e a última aos bens temporais da Igreja. Pelo meio são tratados outros assuntos, como a figura do Prelado Diocesano (III), a Cúria diocesana (IV), o Cabido (V), os Arciprestes (VI); Párocos e Coadjutores (VII), direitos e deveres dos leigos (IX), a Ação Católica (X), associações de fiéis e confrarias (XI). Há um largo espaço dedicado aos sacramentos (XII a XXII), vêm, depois, orientações sobre espaços litúrgicos, procissões,  paramentos e alfaias (XXIII a XXVII).

 

Ao lermos estas 28 constituições, encontramos nelas muitas orientações que são devedoras do contexto cultural da época e por isso, pelo menos algumas, estão ultrapassadas no tempo ou por futura legislação. Mas também encon­tramos matérias que não perderam atualidade e podem mesmo inspirar a nossa prática pastoral. Assim, é notória a insistência na espiritualidade sacerdotal e na formação permanente do clero, privilegiando o instrumento das conferências eclesiásticas (I, 13) e recomendando os exames de repetição, em ritmo anual, sobre matérias teológicas, da Moral e do Direito (I, 11). O Cabido é tratado como  sendo os respetivos cónegos “os primeiros colaboradores e dedicados conse­lheiros” do Bispo (V, 56). Aos arciprestes é cometida a missão de serem “os coordenadores de toda a ação paroquial, dentro do arciprestado” (VI, 58) e com o encargo de visitarem as paróquias, pelo menos uma vez por ano e apre­sentarem relatório ao Prelado (I, 59). A constituição sobre os direitos e deveres dos leigos é pouco desenvolvida. Para além de algumas proibições, recomenda que seja assinalado o Dia Anual do Sacerdócio, no Domingo do Bom Pastor, em homenagem ao respetivo Pároco (IX, 98). Na constituição sobre as associações de fiéis é de assinalar a determinação de que em cada freguesia seja cano­nicamente ereta  a Associação ou Confraria da Doutrina Cristã, com a finalidade de cuidar da catequese (XI, 111). A razão, indicada mais à frente, é que a catequese é a obra fundamental da Paróquia (XXVII, 313). Sobre os sacra­mentos, desenvolve-se longamente legislação aplicável. Acautela contra a profanação do domingo ( (XXV, 289) e já então recomendava que, quando, por falta de sacerdotes, não puder haver missa, alguma pessoa piedosa reze o Terço, a Via-sacra ou outra devoção (XXV, 290). Estão previstos agrupamentos de paróquias, por alguma das seguintes duas razões – falta de sacerdotes ou impossibilidade de garantir o seu sustento (XXVIII, 346). Ainda sobre formação cristã, recomendam-se as missões populares, a catequese de adultos, conforme determinado pelo Concílio Plenário Português e  retiros, convidando os párocos  a motivar os fiéis para neles participarem (XXVII, 322. 328.330). Quando fala nos bens temporais da Igreja, insiste na atenção devida ao clero pobre, é criado o Fundo Diocesano com essa finalidade e determina-se que os sacerdotes para ele contribuam livremente e as mordomias, irmandades e confrarias o façam também, com a entrega de 3% das suas receitas (XXVIII, 343, 346 e 349). A este fundo diocesano junta-se um outro organismo, que já existia, denominado “Obra de S. José”, com a mesma finalidade.

 

II-Assembleia Diocesana, em 2017

 

No ano de 2017, realizou-se, na nossa Diocese, a Assembleia Diocesana de re­pre­sentantes.

Foram três sessões, cumpridas nos dias 29 de abril, 20 de maio e 17 de junho. Ficou aprazada uma quarta sessão, para iniciar o processo de recepção das proposições votadas e aprovadas nas três anteriores. Esta Assembleia cumpriu o voto formulado numa das assembleias gerais do clero realizada em 2012 e começou a ser preparada a partir do ano de 2014. Quisemos que esta preparação fosse feita em caminhada sinodal. Para isso, depois do levantamento das grandes preocupações dos diocesanos em geral, das suas comunidades e ainda tendo em conta as prioridades da Igreja enquanto tal no momento presente, elaborou-se um instrumento de trabalho, com três apartados – um so­bre o mistério da Igreja, outro sobre a evangelização e outro sobre a celebração da Fé. Este instrumento de trabalho ficou pronto no ano de 2016 e procurámos que, durante um ano (2016-2017), os assuntos nele apresentados fossem refletidos e dialogados pelos fiéis em geral, pelos Párocos e seus mais diretos colaboradores, nos conselhos pastorais arciprestais, no Conselho Pas­toral Diocesano e no Conselho Presbiteral. Além disso, publicámos o instru­mento de trabalho na página da Diocese e  abrimos ao público em geral a possibilidade de se fazerem sugestões sobre cada um dos assuntos nele apresentados. Foi oportunamente nomeada a Mesa da Assembleia Diocesana, que recebeu as diferentes sugestões e propostas e as transformou em proposições, que foram objecto de discussão, votação e aprovação, em cada uma das referidas três sessões da Assembleia. Nessas três sessões, foram aprovadas 89 proposições, que agora devem orientar a vida da Diocese, ao longo dos próximos anos, assim distribuídas: 20 sobre o mistério da Igreja que nós somos: 36 sobre o serviço da evangelização com que estamos comprometidos, 33 sobre a celebração da Fé.

 

Destacamos agora notas especialmente marcantes das 89 proposições apro­vadas.

Assim, quanto ao primeiro conjunto, a insistência foi na realidade da Igreja Comunhão e Povo de Deus (prop. 1 e 2), servida por um conjunto de ministérios ordenados uns e laicais outros (prop. 7 e 8). Sublinha-se a vocação e a missão dos leigos na Igreja e no mundo (prop. 5 e 6) e recomenda-se a reorganização pastoral da Diocese para serviço  da comunhão e a da missão (prop. 20).

 

As proposições sobre a evangelização começam por insistir no primado que devemos saber dar à Palavra de Deus (prop-1 a 5) e na formação cristã, com suas etapas e diferentes modalidades (prop. 6 a 12), de que a catequese, da infância e adolescência, mas também dos jovens e adultos, é parte primeira e essencial (prop. 16 a 23). O imperativo de promover a evangelização das famílias (prop. 24 a 28), assim como o de sabermos usar os meios de comunicação para serviço da evangelização (prop. 29 e 30) foram pontos marcantes, como também o cuidado devido aos mais pobres (prop. 31 a 36).

 

Quanto à celebração da Fé, a valorização do domingo e das assembleias do­minicais (prop. 8 a 10), mesmo quando não é possível que sejam com celebração da Eucaristia, a necessidade de valorizarmos cada vez mais a Iniciação Cristã (prop. 13 a 16) assim como a atenção devida aso outros sacramentos (prop. 17 a 26) foram pontos dominantes. A aposta na formação  litúrgica dos fiéis em geral (prop. 1 e 2) e na específica para os ministérios da liturgia (prop. 3 a 7) tiveram nesta assembleia indicações claras. A celebração das exéquias (prop. 27 e 28) e as festas religiosas (prop. 29 e 30) pelo significado e mesmo impacto que têm na vida dos fiéis e também das pessoas em egral foram cuidadosamente trata­das.

 

Uma vez aprovadas estas 89 proposições, ficou aberta uma nova etapa, a etapa da sua recepção e aplicação no conjunto da nossa Diocese. Como não se pode fazer tudo ao mesmo tempo, estamos a percorrer esse caminho por partes e por etapas.

Assim, logo a seguir ao encerramento da Assembleia e ainda antes de se realizar a quarta sessão, no dia 5 de outubro imediato, foi nomeada uma comissão para dar cumprimento ao pedido feito logo na primeira sessão para que se promovesse a reorganização pastoral da Diocese (Prop. 20). Esta apresentou a sua proposta de reorganização no ano de 2019 e, depois de ser sujeita ao parecer do Conselho Presbiteral e do Conselho Pastoral Diocesano, começámos a trabalhar na sua implementação, que conduziu, para já, à publicação de dois decretos episcopais, um  sobre os novos arciprestados – eram 15 e passaram a sete - e outro sobre os serviços diocesanos e sua articulação, que entraram em vigor em 29 junho de 2020.

 

A pandemia atrasou, de facto, o processo de implementação destes dois decretos, mas continuamos empenhados em os levar à prática, incluindo a definição dos conjuntos de paróquias que havemos de saber fazer evoluir para constituírem as desejadas unidades pastorais.

Quisemos assinalar o primeiro ano do processo de recepção da Assembleia com a celebração do Dia da Diocese, em 2 de junho de 2018, e simultaneamente com a publicação de uma carta pastoral orientadora deste processo de recepção intitulada “Guiados pelo Espírito Santo, Igreja em renovação”.

Também dentro do mesmo processo de recepção, no ano de 2019, fizemos um plano pastoral Diocesano para três anos (2019 a 2022). Este plano  está centrado em duas realidades da maior importância e profundamente interligadas – os jovens e as famílias.

Ao colocarmos o horizonte de 2022, estávamos a pensar na realização da Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, que, entretanto, foi adiada para 2023, o que também nos permite dispor de mais tempo para cumprir esse programa. Confiamos para tal no abrandamento da pandemia ou, pelo menos, na nossa capacidade de convivermos com ela.

 

 

III – Comparando estes dois eventos Diocesanos

 

Sendo diferente, esta Assembleia Diocesana de representantes tem conver­gên­cias com o propósito do último Sínodo Diocesano da nossa Diocese.

 

Assim, no Sínodo Diocesano de 1949, os delegados eram só sacerdotes, repre­sentando, embora, várias realidades pastorais. Na Assembleia de 2017, os 247 representantes nomeados eram maioritariamente leigos. Também se procurou que, quer na recolha dos assuntos a tratar, quer na sua reflexão e votação, fossem valorizados os contributos dos fiéis em geral, mas igualmente dos diversos instrumentos de participação, como são os párocos com seus mais diretos colaboradores, os conselhos pastorais arciprestais, o Conselho Pastoral Diocesano e o Conselho Presbiteral. Lembramos que também para o Sínodo foram pedidas sugestões, que deviam ser apresentadas através dos sacerdotes delegados.

 

A perspetiva do Sínodo Diocesano foi predominantemente jurídica, pois se pro­punha, como refere o decreto de convocação, “codificar a legislação diocesana” publicada após a promulgação do Código de Direito Canónico (1917), depois do Concílio Plenário  Português (1926) e também da Concordata de 1940. Isto, muito embora apontasse para um “ressurgimento pastoral e disciplinar”.

A perspetiva desta Assembleia Diocesana de representantes foi, desde o início, predominantemente pastoral, deixando para outros documentos a regulamen­tação de muitos dos assuntos pastorais nela tratados.

 

Ambas estas iniciativas diocesanas tiveram como objetivo levar novo impulso à vida da Diocese, às suas instituições e sobretudo aos seus servidores, dos quais depende a desejada renovação, a começar pelos sacerdotes.

 

Para este processo de recepção e aplicação da nossa Assembleia Diocesana à vida da Diocese, que certamente continuará em curso por largo tempo, pedimos ao Senhor a luz e a força do Seu Espírito, sobretudo para todos nós os sacerdotes, para os diáconos  e aqueles que mais de perto colaboram connosco na ação pastoral.

 

Guarda, 3 de janeiro, Solenidade da Epifania de 2021

 

+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda