Quaresma - Tempo para fortalecer a cultura do cuidado
Foi a lembrar-nos a responsabilidade de cuidarmos bem uns dos outros que o Papa Francisco iniciou este ano de 2021, com a sua mensagem para o Dia Mundial da Paz. Nela chamou a atenção para a responsabilidade de desenvolvermos a cultura do cuidado, contra a tentação da indiferença globalizada
Agora, vamos, em breve, entrar na preparação da Festa da Páscoa, o que acontece já no próximo dia 17 deste mês, Quarta-Feira de Cinzas e início da Quaresma, tempo de 40 dias, cujo simbolismo nos remete para os 40 dias de jejum vividos por Jesus no deserto em preparação do seu Ministério da Vida Pública.
Recomenda-nos a prática do jejum, da oração e da esmola; e também especial acolhimento da Palavra de Deus.
Ora, o jejum, que acompanha a vida da Igreja desde o seu início, aponta-nos para aquela dimensão da nossa vida, muitas vezes esquecida, mas contida nas palavras de Jesus, quando responde ao tentador – “Nem só de pão vive o homem...”. É que o alimento e os bens materiais não são em si mesmos um absoluto, o tudo da vida pessoal de cada um de nós, mas existem para serem bem geridos a favor de todos, com especial atenção aos mais necessitados.
Daí a recomendação da esmola e da partilha que ela significa, por força da nossa condição de filhos de Deus e irmãos uns dos outros. Merecem, por isso, o nosso apreço e colaboração as instituições de caridade, como os centros paroquiais e outras, que procuram ajudar quem precisa, privilegiando os mais fragilizados.
Em tempo de pandemia e na Quaresma, que nos recomenda a oração mais intensa, rezamos pelas vítimas do Covid e suas famílias, pelos profissionais de saúde e outros cuidadores, como capelães e voluntários.
A Quaresma é também, na tradição cristã, um tempo especial de penitência e de reconciliação. De penitência, porque nos propõe aquela mudança de mentalidade e de comportamentos para que apela o primeiro anúncio do Evangelho. A penitência, por um lado, abre o nosso coração à graça de Deus que, de facto, nos liberta de muitas limitações e pecados; e por outro lado, implica-nos nesse processo de mudança, através do esforço pessoal, vulgarmente chamado ascese, que envolve sempre sacrifício e põe termo à rotina e à preguiça espiritual, que muitas vezes nos enredam.
A reconciliação é com Deus, com o nosso projeto pessoal de vida, com os outros e com a própria natureza. E, no processo da reconciliação, vamos experimentando a misericórdia de Deus que nos é oferecida de muitas maneiras, mas especialmente no Sacramento da Reconciliação, que habitualmente se celebra com mais intensidade neste tempo, sendo preparado, com frequência, em celebrações penitenciais, incluindo ou não a modalidade da absolvição coletiva.
Querendo nós, ao longo da Quaresma, dar especial cumprimento à recomendação de cuidarmos bem uns dos outros, urge procurar reforçar o nosso propósito de viver a solidariedade e a partilha, especialmente com os mais necessitados.
Por isso, apesar da pandemia e mais ainda por causa dela, vamos fazer a nossa renúncia quaresmal com duas finalidades.
Uma delas é ajudar a superar a grave crise humanitária que se vive no norte de Moçambique, em que continua a crescer o número de mortos e refugiados. Com essa finalidade, entregaremos metade dessa nossa renúncia ao Bispo da Diocese de Pemba (antes chamada Porto Amélia), no norte de Moçambique, D. Luís Fernando Lisboa, o rosto desta causa, que já foi levada ao Parlamento Europeu, suscitou a atenção do Papa e chegou também à nossa Assembleia da República. Lembramos, ainda e a propósito, que o primeiro Bispo desta mesma Diocese do norte de Moçambique era natural da nossa Diocese (Aldeia do Souto – Covilhã), o Sr. D. José Garcia, falecido em m 2010.
A outra metade da nossa renúncia quaresmal destinamo-la a um fundo de solidariedade, dentro da nossa Diocese, gerido conjuntamente pela Caritas e pelas Conferências Vicentinas, para responder a necessidades novas, fruto da pandemia, entre nós. E temos presente o bom trabalho realizado conjuntamente por estas duas instituições, quando houve um fundo de solidariedade criado pela conferência Episcopal, há alguns anos atrás, com o qual foi dada resposta a várias situações de pobreza relevantes, nesta Diocese.
Esperamos poder entregar a nossa renúncia quaresmal na Assembleia do Domingo, no final da Quaresma. Se assim não puder ser, através da forma julgada mais conveniente, fá-la-emos chegar ao Pároco ou a quem ele indicar.
“Arrependei-vos e acreditai na Boa Nova” são palavras que vamos ouvir na abertura da Quaresma, em Quarta-Feira de Cinzas.
Que a luz de Deus, a proteção de Maria Santíssima e o exemplo de S. José, o homem do silêncio e da vigilância ativa, no ano especial que lhe é dedicado, nos ajudem a viver intensamente a nossa Quaresma.
5.2.2021
+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda