Viver o Natal - À escuta de Deus e dos outros
Estamos de novo no Natal.
Tudo se transforma à nossa Volta, com o colorido das luzes e a criatividade dos comércios, mas sobretudo porque se fortalecem a proximidade e as relações entre as pessoas, com o reencontro das famílias, a memória dos que nos precederam ou simplesmente estão fora, mas não podemos deixar de os lembrar.
É certo que a pandemia nos continua a impor muitas cautelas, mas a mensagem natalícia de proximidade e partilha toca-nos o coração.
De olhos postos no Menino de Belém, deitado na manjedoira, sob o olhar contemplativo e atento de sua Mãe e S. José, queremos viver este Natal à escuta de Deus e dos outros.
Jesus cumpriu o mandato do Pai e veio ao meio de nós, dirigindo-se, em primeiro lugar aos últimos, representados nos pastores e nos ambientes que eles muito bem conheciam, como é o caso da manjedoira e dos animais.
Experimentou primeiro a rejeição daqueles que não Lhe quiseram abrir as portas das hospedarias no coração da cidade e, por isso, escolheu as periferias do campo dos pastores.
Mas não deixou de ser reconhecido e visitado pelos magos, sábios, vindos dos Oriente, que, perscrutando os sinais do alto, se deixaram guiar pela estrela ao encontro Menino de Belém, Salvador da Humanidade.
Também nós hoje, diante do Presépio de Belém, nos sentimos interpelados para, antes de mais, escutar o próprio Deus, que nos fala através dos seus sinais discretos, mas verdadeiros, presentes nos acontecimentos da história, dentro e fora da Igreja.
Vivemos hoje, é certo, um silêncio “ensurdecedor” de Deus, quantas vezes promovido por interesses inconfessados, mas não desistimos de permanecer vigilantes para O escutar, também agraciados pela companhia e pela luz do Seu Espírito.
E sabemos que não podemos escutar a Deus e, ao mesmo tempo, recusar a escuta dos outros nossos companheiros, na viagem da vida.
Ora, o tempo do Natal e a sua preparação no Advento convidam-nos a fortalecer a atitude da escuta, para ouvirmos e tentarmos compreender tantos dramas instalados à nossa volta, como é o caso de famílias desfeitas ou gente que perdeu o gosto de viver, porque não tem trabalho, porque se enganou nas escolhas da vida ou não tem condições para fazer aquilo para que se julga mais vocacionado ou simplesmente sente o abandono dos familiares, dos amigos ou da sociedade como tal.
Temos obrigação de nos cuidar uns aos outros, cada um de acordo com a sua situação e necessidades, o que obriga a permanecermos sempre à escuta. O número elevado de pessoas que, nas nossas terras, vivem sós, porque os familiares ou já não existem ou tiveram de partir, é preocupante e obriga-nos a inventar permanentemente novas formas de desfazer as solidões. Agradecemos à GNR a inventariação destes casos, que não nos podem deixar indiferentes.
Mas, para além de escutarmos as pessoas, temos também de saber escutar a conjuntura que nos envolve e tomar consciência das suas implicações na nossa vida pessoal e comunitária.
Assim, o último censo do recenseamento da população residente nos nossos meios revelou grandes constrangimentos, o que, aliás, já estávamos a prever.
Somos menos, em média entre 5 e 10 por cento, com a agravante de ainda serem bastante menos percentualmente os que trabalham e podem garantir a natalidade que nos falta.
Por isso, não nos surpreendem os resultados de estudo recentemente feito na Guarda, segundo o qual, neste momento, as empresas sediadas entre nós não encontram pessoas que possam recrutar para os seus quadros e, por isso, outras que desejariam instalar-se aqui não vêm.
O Natal é tempo para fortalecermos a esperança, de olhos postos na pobreza do Menino de Belém que vem para nos surpreender, apontando novos caminhos.
Boas festas e Santo Natal, no aconchego caloroso e feliz das nossas famílias.
Guarda, 16 de Dezembro de 2021
+Manuel R. Felício, Bispo da Guarda