Comunicação do Bispo Diocesano

Conselho Presbiteral de 17.2.2023

Comunicação do Bispo Diocesano

 

Na passada segunda-feira, foi tornado público o relatório final da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa.

Por ele, ficámos a saber que houve 564 testemunhos de vítimas que se apresentaram à Comissão Independente, dos quais 512 foram validados; que nem todos os acusados são sacerdotes, embora a maioria o seja (77% o seja); que há 25 casos comunicados pela Comissão Independente ao Ministério Público para investigação, sem sabermos quem são os acusados nem os acusadores e/ou as vítimas.

De facto, o relatório confirma que houve vítimas, em Portugal, ao longo destes últimos setenta anos, independentemente do seu número. Mas para nós, uma só que fosse, não poderia deixar-nos indiferentes, pois, como tem repetido o Papa Francisco, “um só caso é realidade monstruosa”.

 

Por isso, no comunicado que publicámos, em nome da Diocese, no mesmo dia em que foi conhecido o relatório da Comissão Independente e em sintonia com a Palavra do Presidente da CEP, dissemos que partilhamos a dor das vítimas que romperam o silêncio e também de outras que porventura estejam envolvidas no mesmo drama. A todas e cada uma manifestamos a nossa solidariedade, ao mesmo tempo que reafirmamos a vontade de tudo fazer para que situações destas não se repitam. Por isso, dissemos da nossa determinação de fomentar em todas as instituições da Igreja e seus servidores uma cultura de prevenção, cuidado e transparência, com “tolerância zero” em qualquer tipo de abusos.

E referimos que contamos com a nossa Comissão Diocesana de Proteção de Menores e Vulneráveis, para intervir sobretudo em três áreas muito importantes, como são:

1.A formação das pessoas, a partir das diretrizes sobre este assunto publicadas pela CEP em novembro de 2020;

2.A disponibilidade para escutar e atender eventuais novos casos;

3.E depois também para acompanhar e ajudar a superar situações dolorosas de quem esteja envolvido em casos desta natureza, sejam vítimas diretas e seus familiares ou mesmo se trate de acusados.

 

Sentimos que nunca será possível reparar o sofrimento e a humilhação causados a cada vítima. Por isso queremos acolher e acompanhar cada pessoa nas suas fragilidades.

 

Também sentimos que a vida da Igreja em Portugal e, em particular, a nossa vida e ministério de sacerdotes, a partir de agora mais confrontados com este facto doloroso, continuam a representar importante serviço à comunidade em geral, que os factos agora vindos a público não podem inutilizar.

Por isso, da nossa parte queremos tudo fazer para que este escrutínio, que foi promovido pela Conferência. Episcopal e não é conhecida mais nenhuma instituição em Portugal que tenha tido a coragem de fazer o mesmo, possa reforçar ainda mais a nossa credibilidade.

Vamos continuar, no silêncio, na humildade e, porventura, com o peso de não sermos compreendidos, a cumprir a missão que nos está confiada, nomeadamente cuidando bem uns dos outros, a começar pelos mais frágeis, crianças ou adultos, sempre com o empenho de promover a justiça e o bem comum.

De facto, este relatório interpela-nos a nós sacerdotes e à Igreja no seu todo, mas é bom que toda a sociedade também se deixe interpelar por ele, pois a Igreja faz parte da sociedade e os sacerdotes igualmente.

Reafirmamos a nossa vontade de tudo fazer para estarmos próximos de todos os que sofrem os efeitos destes abusos inqualificáveis, a começar pelas vítimas mais diretas.

E, se aparecerem suspeições com o apontar de nomes, queremos acompanhar os processos de averiguação que, porventura, tiverem de ser realizados, para que seja averiguada toda a verdade e se faça completa justiça.

Ao mesmo tempo, queremos aproveitar para crescer e ajudar a crescer as pessoas em geral na determinação de que o mal é sempre para erradicar, sobretudo por sabermos que as suas consequências nunca prescrevem.

Por isso, estes são também tempos de exame de consciência para identificarmos as mudanças que urge realizar nas nossas vidas e nas comunidades quanto à obrigação de prevenir situações desta natureza e de cuidarmos bem uns dos outros.

 

Finalmente, reafirmamos a certeza de que a conversão é sempre possível e que não há dramas insuperáveis. Daí o nosso acolhimento e acompanhamento dirigido sempre a todos, sem exceção, pois a Igreja nunca expulsa ninguém do seu seio, sem prejuízo do dever de cumprir todos os procedimentos da legislação canónica e de colaboração com o civil que os eventuais factos exigirem, sempre procurando exercer a solicitude da mãe extremosa para correção dos seus filhos, em todas as circunstâncias.

 

17.2.2023

 

+Manuel da Rocha Felício, Bispo da Guarda

 

Na sequência desta comunicação, o Conselho continuou a analisar a situação e fizeram-se, entre outras, as seguintes observações:

 

1.O relatório diz que os seminários foram os lugares com mais casos testemunhados. Mas, apesar de a maior parte dos seminários menores já terem encerrado, em Portugal, é de justiça reconhecer os relevantes serviços que eles prestaram à Igreja e à sociedade, ao longo de séculos e particularmente durante estes últimos setenta anos.

 

2.A Igreja assim como o ministério e vida dos sacerdotes estão a ser fortemente questionados, mas quaisquer que tenham sido os factos ocorridos, eles não podem anular a integridade de vida e a dedicação comprovada da esmagadora maioria dos sacerdotes e outros agentes pastorais da Igreja em prol do bem comum.

 

3.Considerou-se que é nosso dever, agora reforçado, criar condições de acompanhamento e de cura para as vítimas, como também para quem as molestou, sem prejuízo do dever de investigar, apurar responsabilidades e fazer justiça, em cada caso.

 

4.É imperioso que as diretrizes sobre boas práticas sejam cumpridas nas instituições da Igreja e seus servidores, assim como por todos os agentes pastorais, nomeadamente 1234

 que a Conferência Episcopal publicou em 2020. Vamos empenhar-nos para que isso aconteça, sobretudo através da Comissão Diocesana de Proteção d Menores e Vulneráveis, incluindo com a possibilidade do recurso a outras instituições para tal vocacionadas.

 

5. Reconhecemos e reprovamos, com profundo pesar, os hediondos factos acontecidos, com o renovado propósito de tudo fazer para que se não voltem a repetir.