Quando caminhamos a passos largos para o fim do ano — e, consequentemente, para o fim do Jubileu da Esperança — há sinais que nos despertam e nos fazem sentir, na pele e no coração, o momento presente que vivemos.
A realidade em que estamos mergulhados, para além de ser profundamente polarizada e politizada, é também marcada por um solitário egocentrismo. São muitas as vezes que somos impelidos a viver refugiados em nós próprios, ignorando o chamamento que Jesus nos faz, a sairmos de nós, a abrirmo-nos ao Outro — independentemente dos juízos mais ou menos aritméticos acerca da sua história.
Este narcisismo doentio é um sinal e um símbolo de uma sociedade profética do eficientismo: uma sociedade tarefeira que alimenta a ansiedade e a fragmentação.
O acolhimento, a atenção e o amor que somos capazes de colocar nas coisas certas são a verdadeira resposta ao abismo encapsulado das “check-lists”.
Todos guardamos dentro de nós um valor absoluto de Bem que nos liberta e nos equilibra. Mas esse Bem é facilmente perturbado pelo ruído que nos rodeia e marca o ritmo da nossa vida como se fosse uma sinfonia desafinada.
Mais do que cedermos ao narcisismo e ao eco do ruído, mais do que ficarmos sedimentados nos espelhos e nos ecrãs, sintamo-nos convidados a tornar o nosso coração numa câmara de ressonância de Cristo — onde o ruído é travado pelo silêncio da contemplação de quem se sabe autenticamente amado.
Abre-se, assim, diante de nós um caminho com duas direções possíveis: a primeira, a da morte e da guerra, que continuam a infligir o desespero e a dor; a segunda, a de um futuro fecundo de respeito, de compaixão e de paz.
Ambos os caminhos estão abertos. Depende de nós discernir, no santuário da nossa consciência, qual deles queremos seguir.
Para mim, está claro: o chamamento de Jesus é um apelo a sermos alegres reconciliadores da bondade — sem medo, sem pré-juízos — centelhas de generosidade, arautos da Esperança e da Paz.
Opinião/reflexão: P. João Marçalo
Foto – Ten Lepers © James C. Christensen
