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Homilia: Centenário da LSJ

Guarda, 18.2.2024

I Domingo da Quaresma

Celebramos o 1º Domingo da Quaresma e festejamos o centenário da Liga dos Servos de Jesus.

No primeiro Domingo da Quaresma, começamos por dar graças ao Senhor por mais estes 40 dias de preparação para a Solenidade da Páscoa, que estamos praticamente a iniciar.

Queremos vivê-los em intensa revisão de vida para depois podermos renovar, com verdade, as promessas do nosso Batismo, como previsto na Noite Pascal. São 40 dias para olharmos o deserto do mundo e da nossa vida pessoal, procurando, no meio das provações que o deserto supõe, refazer a experiência da proximidade e da companhia de Deus, que o Seu Povo também fez, mesmo à mistura com muitas infidelidades.

Também Jesus quis experimentar a agrura do deserto, como lembra hoje o Evangelho de Marcos.

Para aí foi conduzido pelo Espírito. Foi posto á prova e tentado, pois, conservando na memória a doçura e o encanto da voz do Pai, escutada no momento solene do Baptismo, agora escuta outra voz, uma voz contrária, que o obriga a escolher. E ele escolheu a voz do Pai e seguiu o caminho que ele lhe apontava, dirigindo-se para Galileia onde iniciou a sua vida pública.

“Completou-se o tempo, o Reino de Deus aí está, arrependei-vos e acreditai na Boa Nova”. É este o Evangelho de Jesus e também o resumo de toda a ação salvadora que o Pai lhe confiou. Este é, de facto, o núcleo do Evangelho e nós queremos voltar a ele, uma e outra vez, ao longo da Quaresma.

Por sua vez, a água e o dilúvio, que a figura de Noé nos lembra e que a I Carta de Pedro comenta, remetem-nos para o nosso batismo, que não apenas purifica, mas sobretudo é compromisso com Deus, diz a carta de Pedro.

Ora, a Quaresma, como tal,  convida-nos a revisitar este compromisso e a revê-lo, procurando fazer os ajustamentos necessários para o podermos renovar na solenidade da Páscoa, o que nós desejamos levar muito a sério.

Festejamos hoje o centenário da Liga dos servos de Jesus.

A Liga é, sem dúvida, um extraordinário dom de Deus à Igreja e em particular á nossa Diocese da Guarda, através das mãos do Venerável Servo de Deus D. João de Oliveira Matos.

Este centenário, que vem sendo preparado desde há mais de um ano, tem de servir para a Liga dos Servos de Jesus, por um lado,  revisitar a sua identidade e missão que estão espelhadas no documento fundacional e por outro, olhar em frente  e ver que respostas é necessário dar às novas situações da Igreja e do mundo que requerem a sua ação continuada.

Esse documento fundacional, que leva a data do dia de ontem de há cem anos atrás, assinado pela secretária Palmira Dinis da Fonseca, contém os pontos essenciais para a vida da Liga que é necessário retomar  de novo e de forma adaptada às circunstâncias atuais, da Igreja e também da própria sociedade.

Agora convido-vos a revisitá-lo comigo.

Terminava um retiro promovido pelo Fundador, o Servo de Deus D. João de Oliveira Matos, com a finalidade específica de dar início a esta importante obra  na vida da Igreja e em particular da Diocese da Guarda.

O retiro, que foi participado por 25 senhoras, iniciou-se a 11 de fevereiro, festa litúrgica de Nossa Senhora de Lurdes, pois se pretendeu adoptar como Padroeira  Nossa Senhora invocada com o título da Imaculada Conceição.

Por sua vez, o propósito do Fundador era., como lá se diz, criar uma associação de almas apaixonadas por Jesus para substituir as ordens religiosas na vivência da Fé e na reparação que elas faziam em Portugal, até que a revolução de republicana de 1910 as extinguiu.

Mais acrescenta que a missão da Liga dos Servos de Jesus é fazer com que Jesus volte a reinar em Portugal, na Diocese, na nossa terra, na nossa família e nos nossos corações. De facto, “é preciso que Ele reine”.

Quem pode fazer parte desta nova obra, a Liga dos Servos de Jesus? Aí se diz que todos os homens e mulheres, solteiros e casados, e mesmo doentes. Também acrescenta o mesmo documento fundacional, em palavras do fundador, que, e citamos,  “lembram-nos algumas senhoras a fundação de núcleos onde se reúnam almas que queiram levar uma vida mais perfeita e que sejam como que a fornalha onde  vão iluminar-se e aquecer-se todas as servas espalhadas pelo todo da Diocese”.

Com estas palavras ficava desenhada a função das comunidades como serviço oferecido a todos os servos e servas da Liga espalhados pela Diocese e não só.

Também nele aparece bem definida a finalidade da Liga, quando o  fundador, no encontro com que encerrou esse retiro da Lageosa, apontou expressamente  a santificação pessoal e a  santificação dos outros, a começar pelos mais afastados de Deus; e propôs os caminhos para cumprir estes desígnios  também de reconstrução da Sociedade  e da Igreja, citamos, “reparando e apostolizando em todos os campos de ação”.

E não se esqueceu de dar indicações sobre os pontos fundamentais do funcionamento e mesmo da estrutura  organizativa da Liga, quando diz que “todas as iniciativas devem ser tomadas sob orientação do Pároco e respeitando sempre as indicações do Prelado”.

E a seguir concretiza compromissos de oração que devem ser assumidos por cada uma e cada um dos associados, no dia a adia.

Mais se conclui deste ato fundacional que o Fundador não tomou esta decisão de ânimo leve; mas primeiro serviu-se da experiência que lhe veio de percorrer a Diocese, em visitas pastorais, ao longo de três anos. Neste percurso tomou nota das necessidades e também potencialidades das mais de 300 paróquias visitadas. Depois valorizou a descoberta que fez de homens e mulheres de tanta grandeza moral que são verdadeiros jardins de virtude, como dizia. E a este propósito, ele mesmo se pergunta, diante do Senhor, em oração, sobre que fazer com estas pessoas. E a resposta foi aparecendo, com indicações precisas, para as congregar e organizar a fim de colocarem as suas capacidades e virtudes ao serviço da comunidade, neste caso, ao serviço da Diocese, que estava necessitada de novo impulso de evangelização e aprofundamento da Fé.

Antes de avançar com a ideia, o Fundador rezou durante mais de uma ano, como fica expresso na ata fundacional, perguntando ao Senhor que fazer. Depois de rezar, consultou o Bispo da Diocese D. José Alves Matoso, o qual considerou a ideia vinda do Céu e mandou avançar. Continuou a rezar e consultou ainda  um outro sacerdote, muito espiritual, com notável influência na vida da Igreja em Portugal e só depois criou a Liga dos Servos de Jesus.

Estes 100 anos são caminho andado em que os propósitos identitários recolhidos no ato fundacional foram sendo postos em prática, de várias maneiras e com variados ajustamentos, às diferentes situações, mas sempre de olhos colocados no propósito original do Fundador.

Certamente que os 38 anos (de 1924 a 1962) em que a Liga contou com a presença física do Fundador foram etapa importante que em muito ajudou a consolidar a identidade do carisma e a sua missão. Para além dos vários serviços que deram e continuam a dar visibilidade à instituição, está a espiritualidade da Liga marcadamente eucarística. Lembramos que decorriam ainda os anos 20, quando se iniciou em todas as casas da Liga a adoração diurna, em permanência, e depois, em 1938 se avançava também para a adoração noturna. E aqui se inspirou o Bispo da Diocese, nos anos 50, para lançar o programa do Lausperene, que é uma das mais importantes marcas do nosso calendário diocesano. Igualmente temos de considerar bom contributo para a vida diocesana os retiros e outras ações de formação organizados, com regularidade, em diferentes pontos da Diocese, um outro contributo que temos toda a vantagem em valorizar.

Claro que nova etapa da liga dos servos de Jesus se seguiu, depois que o Fundador partiu ao encontro de Deus e já lá vão 62 anos.

É normal que o carisma da Liga, procurando sempre manter a fidelidade às origens, vá procurando ler e interpretar as novas interpelações que lhe faz a atualidade da vida da Igreja e do mundo.

 E, neste esforço de fazer o devido ajustamento às novas circunstâncias, convém ter sempre presente o exemplo do Fundador, que nada decidiu de ânimo leve, mas rezou longamente, fez consultas várias, desde o Bispo Diocesano a outras figuras influentes da vida da Igreja e da própria sociedade; e só depois se decidir pela fundação.

É o que hoje temos de continuar a fazer perante as novas decisões que é preciso tomar.

Rezemos ao Senhor para que esta celebração do centenário possa imprimir novo dinamismo e nova esperança na vida da Liga dos Servos  de Jesus e igualmente na nossa Igreja Diocesana, que dela tem muito a esperar.

Como prenda de centenário, a Diocese destina para a Liga dos servos de Jesus a sua renúncia quaresmal deste ano, com a expressa finalidade de, em cooperação com os missionários da Boa Nova, revitalizar o Centro Missionário de Espiritualidade que ela mesma criou em Angola.

Entregamos, nesta celebração centenária, à bênção de Deus e à proteção maternal de Nossa Senhora a Liga dos Servos de Jesus.

18.2.2024

+Manuel da Rocha Felício, Bispo da Guarda