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Homilia Episcopal: Aniversário da dedicação da Catedral – 22 de outubro de 2025

«Eis a morada de Deus com os Homens: Deus habitará no meio deles.»

Esta palavra com que aclamámos o Evangelho revela-nos o fio unificador da Palavra de Deus que acabámos de escutar e explicita o sentido de celebrarmos anualmente a dedicação da nossa igreja catedral.

Vivida liturgicamente em todas as igrejas da diocese como uma festa do Senhor (e aqui, na catedral, como solenidade do Senhor), esta celebração ensina-nos que a presença sensível de Deus entre nós não terminou no final da vida terrena de Jesus. Na força do Espírito Santo, Ele permanece como morada de Deus com os Homens, realmente vivo e presente na Igreja: na comunhão dos discípulos reunidos em torno do bispo; na Eucaristia e demais sacramentos; na Palavra proclamada; na caridade praticada.

Na unidade do Espírito Santo que é a Igreja, Deus continua a vir até nós em Jesus Cristo, e nós continuamos a ter acesso a Deus, por Jesus Cristo. Celebrar a dedicação da catedral é celebrar o mistério do Corpo místico de Cristo que é a Igreja, lugar de encontro do Homem, não apenas comDeus mas em Deus.

Esse lugar já não é uma realidade espacial, delimitada dentro dos muros do templo, mas a realidade sacramental onde o espaço físico abre e remete para o encontro com Cristo em espírito e verdade. Contrariamente a algumas interpretações espiritualistas, marcadas por um neo-gnosticismo ou por um subjectivismo intimista, o templo não se torna irrelevante. Deixa é de ser exclusivo (único lugar da morada de Deus) para ser abertura: um sinal instrumental que nos convoca e transfere para o encontro com Deus.

Na assembleia dos discípulos reunida neste templo, descobrimo-nos «concidadãos dos santos e membros da família de Deus», e «edifício (…) bem ajustado, para formar um templo santo do Senhor». Na celebração realizada neste templo, sois renovados na «união com Ele (…) para vos tornardes, no Espírito Santo, morada de Deus».

Para cultivar esta união com o Senhor, a Igreja oferece-nos em primeiro lugar a celebração dos Sacramentos e dos Sacramentais. Os Sacramentos são sinais instituídos por Jesus Cristo para conferir a graça santificante, são acções de Cristo e da Igreja, eficazes pela própria obra realizada (ex opere operato); já os Sacramentais são sinais sagrados instituídos pela Igreja para preparar para os Sacramentos e para fazer crescer na santidade que estes promovem, são acções frutíferas pela oração da Igreja e pela devoção do fiel (ex opere operantis Ecclesiae).

Associados a estas acções santificadoras, existem outros sinais que nos dispõem para nos abrirmos e acolhermos a obra de Deus. Na catedral, igreja do bispo na diocese de que é pastor, e por isso igreja mãe de todas as igrejas da diocese confiadas ao seu cuidado pastoral, encontramos alguns desses sinais.

Em primeiro lugar, o próprio templo. Marcado com os traços da fé das diferentes gerações e gerações de fiéis que rezaram neste lugar, presididas pelos sucessores dos apóstolos, o templo incute em nós a consciência de pertencer à única Igreja de Cristo que nos vem desde o grupo dos Doze. E anuncia à cidade a perenidade do dom e do chamamento de Deus.

Depois, temos o altar. Reunindo em si a pedra do sacrifício e a mesa do Senhor, o altar é o símbolo do próprio Cristo, presente no meio da assembleia de seus fiéis, ao mesmo tempo como vítima oferecida para a nossa reconciliação e como alimento celeste que se nos dá e que edifica a Igreja. Por isso está presente no centro da assembleia e não acoplado à parede. E na liturgia Eucarística presidida no altar pelo bispo com seu presbitério, rodeado de ministros, com participação plena e activa de todo o povo santo de Deus, manifestamos ao mundo o mistério da Igreja.

Temos também o ambão. Ele é a mesa da proclamação da Palavra de Deus (e de nenhumas outras leituras ou avisos) que, como o nome indica, é o lugar elevado de onde se anuncia que Cristo se levantou do túmulo para consumar a obra Deus para nossa salvação. Na liturgia da Palavra a partir do ambão e presidida pelo bispo transparece o primado do anúncio pascal na missão da Igreja.

Temos ainda a cátedra ou cadeira episcopal. A partir dela, situada de modo que possa ver e ser visto pela sua comunidade, e transpareça a comunhão a partir da cabeça, preside e prega o bispo quando vem à Sé. Não se trata de um trono mas do símbolo, talvez o mais antigo, do ministério episcopal, do seu magistério e do seu serviço pastoral. Presididos e iluminados a partir dela pelo bispo, somos enviados com a força profética do mandato apostólico.

Num outro âmbito de significação temos também o cabido de cónegos da catedral. Instituídos para celebrar as festas litúrgicas mais solenes na catedral (segundo as possibilidades permitidas pelos demais ofícios a eles confiados pelo bispo), garantem deste modo que nesses dias de maior significado litúrgico transpareça o mistério da Igreja que vimos referindo.

Um deles recebe também o importante ofício de cónego penitenciário, com faculdade ordinária, que não pode delegar a outrem, de absolver no foro sacramental das censuras associadas a delitos mais graves, as latae sententiae, não declaradas nem reservadas ao Papa mas sim ao bispo.

Os cónegos são chamados ainda a desempenhar outras funções que o bispo atribua. É minha intenção pedir-vos que possais assumir a dinamização da catedral como agente facilitador do diálogo entre a fé e a cultura, entre a estética cristã e as artes contemporâneas, entre a mística evangélica e as espiritualidades seculares.  Para tal haveremos de reativar as funções necessárias, revendo os estatutos, para que estas apareçam como serviços orgânicos de natureza pastoral e não como dignidades de honra.

De facto, a dignidade na Igreja não deve invocar nenhum tipo de estatuto, mas sim a imagem de Deus que cada um traz inscrita em si mesmo. A imagem comum a todos enquanto filhos de Deus; alguma imagem específica enquanto carisma recebido para um determinado serviço da pastoral.

***

Ao terminar, lembro o caminho sinodal e o calendário pastoral que apresentei à Diocese esta tarde. Aplicando o documento final do Sínodo dos Bispos sobre a sinodalidade, formaremos grupos sinodais de proximidade nas nossas paróquias, grupos de paróquias, arciprestados, comunidades religiosas, movimentos, que se reunirão entre dezembro e fevereiro.

Daqui até 30 de novembro procuraremos constituir os grupos e identificar os leigos e leigas, e diáconos, que possam vir a ser os animadores ou facilitadores do funcionamento dos mesmos. Nesse dia, primeiro domingo do advento, juntar-nos-emos numa tarde de formação e vigília para iniciarmos esta caminhada anual.

Com ajuda de uma ferramenta de trabalho elaborada pelo Secretariado de Coordenação pastoral, como Povo de Deus procuraremos escutar o Espírito Santo na identificação da Diocese que somos, suas forças e fragilidades, e das propostas de implementação para uma Igreja mais sinodal e corresponsável, mais evangelizadora e missionária.

Em abril e maio faremos assembleias diocesanas a partir dos trabalhos realizados anteriormente. Por essa altura, definiremos as unidades pastorais a implementar no ano seguinte, segundo as necessidades e possibilidades da Diocese, e assentes em equipas pastorais de sacerdotes diáconos e leigos, numa pastoral de evangelização e não de manutenção, e abrangendo um território mais vasto de paróquias.

Em setembro de 2026, após a elaboração da síntese dos trabalhos das assembleias sinodais diocesanas, faremos um assembleia diocesana final para definir as prioridades que darão depois corpo ao plano pastoral para os próximos tempos.

Neste caminho eclesial, guiai-nos, Senhor! Enviai à nossa Igreja diocesana as vocações de que necessita para esta transformação missionária.

«Estai atento, Senhor, meu Deus, à prece e à oração do vosso servo, escutai o apelo e a súplica que hoje vos dirige. Escutai a oração que neste lugar Vos [dirigimos]».

+ José Pereira, Bispo da Guarda

 

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