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Mensagem Episcopal: Natal 2025

O Senhor Bom! O Senhor está próximo!

Como acontece ciclicamente, nesta altura do ano estamos a viver a quadra natalícia. Sucedem-se as luzes de Natal, os jantares de Natal, os concertos de Natal; surgem as promoções comerciais de Natal, e as campanhas solidárias de Natal; multiplicam-se os encontros familiares, os votos de boas festas, os sentimentos de solidariedade, harmonia, justiça, paz e bem. E repetem-se os desejos, mesmo que pouco convictos, de que tudo isto se prolongasse por todo o ano porque, no dizer de muitos, “o Natal é quando o Homem quiser”.

Então, porque não saímos deste “eterno retorno” que parece manter o Natal confinado a esta fase final do ano e transição para o ano novo? Talvez porque nos tenhamos esquecido do que é o Natal, e da sua força transformadora e recriadora para o mundo.

Recordam-nos os que o viveram ou conviveram com os seus intervenientes: «o Verbo [n.d.r.: Deus] era a luz verdadeira, que, vindo ao mundo, ilumina todo o homem. […] Veio para o que era seu, e os seus não O receberam. Mas àqueles que O receberam e acreditaram no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. Estes não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus. E o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós» (Jo 1, 9-14).

O Natal é a decisão e o efeito de Deus ter vindo habitar no meio de nós; assumiu a nossa condição humana, a cultura de um povo, a sua língua, usos e costumes, sem deixar nada do que era. E para nos enriquecer com o que trazia, sem com isso constituir qualquer ameaça, antes uma renovação. Refez os laços entre diferentes grupos em Israel e tornou irmãos, judeus e gentios.

O Natal traz um novo olhar e uma nova possibilidade às questões da imigração, das polarizações sociais e políticas, da fraternidade nas relações. Como dizia o texto, torna possível não absolutizar as relações no ius soli ou ius sanguinis, nem as submeter aos impulsos primários da repulsa e medo ou da paixão, nem as manipular segundo critérios ideológicos de reconfiguração social ou de interesse economicista que as reduz a fonte mão de obra, financiamento da segurança social ou resolução do inverno demográfico.

Quem recebe o que o Natal é pode tornar-se filho de Deus. O Natal torna possível construir-se novas soluções de fraternidade universal, de acolhimento digno a quem chega,de cuidado para com os mais fragilizados, superando as lógicas do interesse ou do medo da ameaça.

O Natal revela-nos ainda que «um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado. Tem o poder sobre os ombros e será chamado “Conselheiro admirável, Deus forte, Pai eterno, Príncipe da paz”. O seu poder será engrandecido numa paz sem fim, sobre o trono de David e sobre o seu reino, para o estabelecer e consolidar por meio do direito e da justiça, agora e para sempre» (Is 9, 5-6)

Assistimos, impotentes, às vezes anestesiados, à perpetuação de conflitos e guerras, de perseguições religiosas (como na Nigéria), de intensificação de umadialética maniqueísta dos maus contra os bons, onde se desqualifica o outro para o cancelar, se escala o conflito, se difunde o discurso condenatório, e com ódio se acusa o outro de discurso de ódio.

O Natal oferece outra possibilidade de relações, fundadasnuma autoridade diferente: a força da aliança e da paz sobre a inimizade e o ódio; o direito e a justiça como promoção do bem comum sobre a lógica de facção ou de grupo; os horizontes do que é duradouro sobre o imediato; o discernimento como abertura à luz do Bem e da Verdade absolutas e universais que resgatam da auto-suficiência e do aparente bem, relativo e contingente.

O Natal diz-nos ainda que Deus escolheu nascer «em Belém da Judeia, porque assim está escrito pelo Profeta: ‘Tu, Belém, terra de Judá, não és de modo nenhum a menor entre as principais cidades de Judá, pois de ti sairá um chefe, que será o Pastor de Israel, meu povo’» (Mt 2, 5-6).

Face à lógica que só reconhece quem domina, quem temcobertura mediática, quem se enquadra na cultura dominante, quem tem acesso aos corredores dos poderes, o Natal mostra que as respostas têm de articular os centros principais e as periferias, a resposta local e todo o povo. Seja nas grandes questões como a paz e o clima, como nas mais imediatas como o desenvolvimento regional, a organização territorial, a floresta e o fogo.

Não esvaziemos o Natal para que possa impulsionar e abrir, de novo, os caminhos que o mundo necessita para os desafios que enfrenta.

Renovados na Esperança que nos fica do Ano Jubilar que estamos prestes a fechar, desejo a todos um Santo e Feliz Natal.

( + José M. Pereira, Bispo da Guarda)

Guarda, 30/10/2025